sábado, 26 de junho de 2010

Virada

"É nóooissss", gritava o rapaz carregando uma pet 2 litros de coca-cola misturada com algum rezendrenke barato à 1 da manhã em frente ao teatro municipal. Era a Virada Cultural. Animal, tesão, ultra-moderno, retomada do centro etc. Sim, sim! Mas, acima de tudo, uma grande cachaçaiada!! Mas na Europa, em Madri, também não é assim?? Deve ser, acredito que bem pior até. Então, qual é o problema? Nenhum, exceto o cheiro de mijo. Descer a escadaria do Shopping Light, naquela noite, foi uma experiência única. O slogan da Virada deveria ser: "Virada Cultural: toma todas na Pinacoteca e gorfa no Municipal".

A viagem das esfihas

"Duas de queijo, uma de carne e um kibe", ordenou a patroa que eu comprasse na esfiharia para saciar sua fome repentina. Ok, a princípio parece ser uma tarefa fácil. No entanto, requer muita atenção e cuidado. Se eu troxesse por exemplo, duas de carne e uma de queijo, aquilo poderia desencadear uma série de problemas. "Você não presta atenção em mim, faz tudo errado". Talvez até uma crise que poderia durar horas ou até dias!! Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Eu não podia esquecer!! Era minha minha missão naquele momento! E já era tarde da noite, eu estava com sono e cansado, até poderia ter uma desculpa caso falhasse. Mas, não, melhor não! Precisava me concentrar e fazer tudo certo: duas de queijo, uma de carne e um kibe. Peguei a chave do carro e segui para cumprir perfeitamente minha tarefa. Vou sem o documento do carro, afinal é super perto. Já é bem tarde, não tem ninguém na rua. É melhor pedir uma proteção e pegar um galhinho de arruda. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Cadê o guarda da rua? Deve estar dormindo ou ouvindo aqueles programas de rádio tipo Gil Gomes. Beleza, deixa eu acelerar então. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Caramba, como o carro está sujo, tá cheio de areia e papel de bala, amanhã vou lavar. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Esse buteco da esquina só tem nóia, deve rolar umas brigas nervosas. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Ainda bem que recapiaram essa rua, tava cheia de buracos. Dá até pra dar um rolê de skate! Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Como está cheia a esfiharia, a fila está gigante. Mas ainda bem que é só para pegar mesa. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Pra estacionar então, deve estar cruel. Que sorte! Uma vaga bem na frente e ao lado da viatura policial para cuidarem do meu carro...rs. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Esses policiais são cara de pau mesmo, só pensam em comer de graça coxinha, kibe, esfiha. Duas de queijo, uma de carne e um kibe. Cadê aquele tiozão barabudo, escrotão, que fica de canto comendo esfiha e tomando várias brejas? Não está, deve ter ido pra um forró-bodó. Só tem garçom novo nessa joça. Ah, vou pedir pra aquele alemãozinho que ele é gente boa: "Por favor, duas de queijo, uma de carne e um kibe. Pra viagem".

Hércules

Numa sexta à tarde, estava eu num daqueles trânsitos típicos da babilônia paulista. Era no bairro da Liberdade, quase na João Mendes. A minha janela do carro estava aberta e parou um motoboy do meu lado e disse: "Eta trânsito pesado. Por isso que eu só ando de moto". "Pois é", disse eu, "Ainda que eu não uso muito o carro durante a semana". "Eu não ando de carro nem a pau", disse o Hércules metropolitano, "Não sei como vc aguenta", enfatizou com um certo ar de superioridade. Pensei comigo: "Pelo menos não vou morrer num corredor da 23 de maio ou da Marginal", mas disse: "É isso ai, meu amigo", quando em seguida ele arrancou pelo corredor de carros e parou no próximo infeliz parado e com a janela aberta e repetiu de peito estufado: "Ê trânsito pesado. Por isso que eu só ando de moto"...

A Malandragem do Brasileiro

Era uma manhã ensolarada de novembro, estava em casa trabalhando. Tocou a campainha. Soava no interfone uma voz ansiosa, de um homem simples do interior:
- "Por favor, sinhô, eu sou pedreiro aqui da construção do lado, meu parceiro caiu e machucou o braço. A gente tava levando ele pro hospital e acabou a gasolina do meu fusquinha na avenida. O sinhô pode me emprestar 10 real, depois eu pago?".
Realmente havia uma construção com bastante pedreiro na rua Acarapé. Disse, de pronto: "Calma que tô indo ai". Peguei o dinheiro e abri o portão:
- "Bom dia", e o rapaz contou a história novamente, meio nervoso. Fiquei desconfiado.
- "Qual seu nome?". Ele começou a tremer.
- "Marcelo".
- "Você trabalha ai ao lado, então?"
- "Sim, sinhô". Nesse momento, saiu um pedreiro de dentro da obra com um carrinho de mão. O rapaz ficou mais nervoso e me apressou. "Então, daqui a pouco eu te devolvo. O rapaz tá lá no carro me esperando".
Com aquela pulga do tamanho de um elefante atrás da orelha, dei adeus a nota de dez e o tal pedreiro saiu vazado pra avenida Luis Góis.
Mesmo sabendo da resposta, fui na casa ao lado e perguntei se trabalhava algum Marcelo: "Não, senhor". Pronto! Cai no conto do vigário! Fui até a avenida dar uma checada pra ver se encontrava o malandro. Estava lá ele, parado. O fusquinha do Sr. Batalha da oficina mecânica, aguardando para fazer mais um socorro no dia.